sábado, 9 de julho de 2011

Senhora

"... o resultado dessa reflexão foi aproximar-se da mulher, ocupada nesse momento a ver os peixinhos vermelhos do tanque fervilharem à tona d'água para devorar os bocados de um jambo com que ela os tentava.

- Estes peixes agora a divertem; disse Fernando. Se amanhã a aborrecerem, mandará que os deitem fora, e que os deixem morrer à fome?"


(refleti muito sobre essa frase, e me identifiquei demais, infelizmente. As coisas me divertem por um tempo, os homens me divertem por um tempo - isso é horrível, mas é verdade - depois eu canso, me aborreço, me entedio e acabo com tudo, SEMPRE.)




SENHORA, José de Alencar

Senhora foi publicado em 1875. O romance pode ser considerado uma das obras-primas de seu autor e uma das principais da literatura brasileira. Uma vez que trata do tema do casamento burguês, ou seja, baseado no interesse financeiro, pode ser considerada precursora do Realismo ou pré-realista. Alencar classifica a obra dentro de seus “perfis de mulher”, já que concentra na mulher o papel mais importante dentro da sociedade de seu tempo. Aurélia é a protagonista do romance, uma jovem mulher dividida entre o amor e o ódio, o desejo e o desprezo pelo homem que ama. Essa personalidade dividida apresenta um desvio psíquico ocasionado a partir do rompimento do noivo, Fernando Seixas, e que causou um certo caso de esquizofrenia na personagem.

Enredo:

Na primeira parte, O Preço, Aurélia Camargo dá a conhecer para o leitor: jovem de 18 anos, linda e debutando nos bailes. A principal ação desta primeira parte do romance começa quando Aurélia pede ao tio que ofereça ao jovem Fernando Seixas, recém-chegado na corte após uma longa viagem ao Nordeste, a sua mão em casamento. Entretanto, uma aura de mistério cobre o pedido, pois Fernando não deve saber a identidade da pretendente e além disso a quantia do dote proposto deve ser irrecusável: cem contos de réis ou mais, se necessário.

A habilidade mercantil de Lemos, que chega a ser caricata, e a péssima situação financeira de Fernando - moço elegante mas pobre, que gastou o espólio deixado pelo pai e que precisava restituí-lo à família para a compra do enxoval da irmã - fazem com que dêem certo os planos de Aurélia.

Na noite de núpcias, Fernando se surpreende ao ver nas mãos de Aurélia, um recibo assinado por ele aceitando um adiantamento do dote. Aurélia se enfurece, acusa-o de mercenário e venal. E ela começa a contar a vida e os motivos que a levaram a comprá-lo.

Na segunda parte, Quitação, conhecemos a vida de ambos os protagonistas. Aqui há um retorno aos acontecimentos em suas vidas, o que explica ao leitor o procedimento cruel de Aurélia em relação a Fernando.

Na terceira parte, Posse, a história retorna ao quarto do casal. Vemos Fernando arrasado de vergonha, mas Aurélia toma o seu silêncio como cinismo. É o início da fase de hipocrisia conjugal.

Na quarta parte, Resgate, temos o desenrolar da trama. Intensificam-se os caprichos e as contradições do comportamento de Aurélia, ora ferina, mordaz, insaciável na sua sede de vingança, ora ciumenta, doce, apaixonada. Intensifica-se também a transformação de Fernando, que não usufrui da riqueza de Aurélia, tornando-se modesto nos trajes, assíduo na repartição onde trabalhava, e assim adquirindo, sem perder a elegância, uma dignidade de caráter que nunca tivera.

No final, Fernando, um ano após o casamento, negocia com Aurélia o seu resgate. Devolve-lhe os vinte contos de réis, que correspondiam ao adiantamento do montante total do dote com o qual possibilitava o casamento da irmã, e mais o cheque que Aurélia lhe dera, de oitenta contos de réis, na noite de núpcias.

Separam-se, então, a esposa traída e o marido comprado, para se reencontrarem os amantes, a última recusa de Seixas sendo debelada quando Aurélia lhe mostra o testamento que fizera, quando casaram, revelando-lhe o seu amor e destinando-lhe toda a sua fortuna.

O enredo deste romance mostra claramente a mistura de elementos romanescos e da realidade. Foco narrativo - O romance é narrado em terceira pessoa por um narrador onisciente, ou seja, que tudo sabe sobre as personagens, penetrando em seus pensamentos e em sua alma. Esse narrador é também intruso, já que interfere em vários momentos, apresentando-se ao leitor. A técnica narrativa empregada por Alencar em Senhora é sem dúvida bem moderna, se tomarmos como base suas obras anteriores, já que o autor utiliza digressões.

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