segunda-feira, 22 de novembro de 2010

O livro dos abraços


Título Livro: O Livro dos Abraços
Autor: Eduardo Galeano
Selo: Coleção Letras Natalenses
Preço médio do livro: R$ 25.00
Disponível em PDF aqui





No seu livro o autor constrói um mundo imaginário a partir das suas afeições por pessoas com quem partilhou a vida e por lugares que o hospedaram nesta viagem. Este é o sentido do abraço. Abraça o mundo, abraça a vida, abraça a cada um de nós. Um enorme abraço feito de fragmentos belos e duros já que emocionam, apaixonam, mas também enraivecem, por isso que a editora alerta: “Abra este livro com cuidado: ele é delicado e afiado como a própria vida. Pode afagar, pode cortar. Mas seja como for, como a própria vida, vale a pena”. O autor mostra que a história pode ser contada a partir de pequenos episódios onde não necessariamente deva haver repentes de heroísmos, mas tenham, sim, de refletir a paixão dos homens pela vida e pelos outros homens.




Trechos:

“Na parede de um botequim de Madri, um cartaz avisa: Proibido cantar. Na parede do aeroporto do Rio de Janeiro, um aviso informa: É proibido brincar com os carrinhos porta-bagagem. Ou seja: Ainda existe gente que canta, ainda existe gente que brinca”

O adeus dos sonhos
"Os sonhos iam viajar. Helena ia até a estação do trem. Da plataforma,
dizia adeus aos sonhos com um lencinho "

Os ninguéns
As pulgas sonham com comprar um cão, e os ninguéns com deixar a
pobreza, que em algum dia mágico a sorte chova de repente, que chova a boa sorte
a cântaros; mas a boa sorte não chove ontem, nem hoje, nem amanhã, nem nunca,
nem uma chuvinha cai do céu da boa sorte, por mais que os ninguéns a chamem e
mesmo que a mão esquerda coce, ou se levantem com o pé direito, ou comecem o
ano mudando de vassoura.
Os ninguéns: os filhos de ninguém, os donos de nada.
Os ninguéns: os nenhuns, correndo soltos, morrendo a vida, fodidos e
mal pagos:
Que não são, embora sejam.
Que não falam idiomas, falam dialetos.
Que não praticam religiões, praticam superstições.
Que não fazem arte, fazem artesanato.
Que não são seres humanos, são recursos humanos.
Que não tem cultura, têm folclore.
Que não têm cara, têm braços.
Que não têm nome, têm número.
Que não aparecem na história universal, aparecem nas páginas policiais
da imprensa local.
Os ninguéns, que custam menos do que a bala que os mata.


O diagnóstico e a terapêutica
O amor é uma das doenças mais bravas e contagiosas. Qualquer um
reconhece os doentes dessa doença. Fundas olheiras delatam que jamais dormimos,
despertos noite após noite pelos abraços, ou pela ausência de abraços, e padecemos
febres devastadoras e sentimos uma irresistível necessidade de dizer estupidezes. O
amor pode ser provocado deixando cair um punhadinho de pó de me ame, como por
descuido, no café ou na sopa ou na bebida. Pode ser provocado, mas não pode
impedir. Não o impede nem a água benta, nem o pó de hóstia; tampouco o dente de
alho, que nesse caso não serve para nada. O amor é surdo frente ao Verbo divino e
ao esconjuro das bruxas. Não há decreto de governo que possa com ele, nem poção
capaz de evitá-lo, embora as vivandeiras apregoem, nos mercados, infalíveis
beberagens com garantia e tudo.

O medo
Certa manhã, ganhamos de presente um coelhinho das índias. Chegou
em casa numa gaiola. Ao meio-dia, abri a porta da gaiola.
Voltei para casa ao anoitecer e o encontrei tal e qual o havia deixado:
gaiola adentro, grudado nas barras, tremendo por causa do susto da liberdade.

O sistema/1
Os funcionários não funcionam. Os políticos falam mas não dizem. Os
votantes votam mas não escolhem. Os meios de informação desinformam. Os
centros de ensino ensinam a ignorar. Os juizes condenam as vítimas. Os militares
estão em guerra contra seus compatriotas. Os policiais não combatem os crimes,
porque estão ocupados cometendo-os.
As bancarrotas são socializadas, os lucros são privatizados.
O dinheiro é mais livre que as pessoas. As pessoas estão a serviço das
coisas.


A televisão/2
A televisão mostra o que acontece? Em nossos países, a televisão mostra
o que ela quer que aconteça; e nada acontece se a televisão não mostrar.
A televisão, essa última luz que te salva da solidão e da noite, é a
realidade. Porque a vida é um espetáculo: para os que se comportam bem, o
sistema promete uma boa poltrona.

A televisão/3
A tevê dispara imagens que reproduzem o sistema e as vozes que lhe
fazem eco; e não há canto do mundo que ela não alcance. O planeta inteiro é um
vasto subúrbio de Dallas. Nós comemos emoções importadas como se fossem
salsichas em lata, enquanto os jovens filhos da televisão, treinados para contemplar
a vida em vez de fazê-la, sacodem os ombros.
Na América Latina, a liberdade de expressão consiste no direito ao
resmungo em algum rádio ou em jornais de escassa circulação. Os livros não
precisam ser proibidos pela polícia: os preços já os proíbem.

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